Ensino Remoto X Ensino Híbrido x Educação à Distância

Após mais de 1 ano de pandemia da Covid-19, inúmeras são as confusões entre os termos. Entenda as diferenças, perspectivas e possibilidades

Termos como ensino remoto, ensino híbrido, educação à distância nunca estiveram tão em evidência quanto agora, momento em que se vive a pandemia da Covid-19, que em muito alterou rotinas, pensamentos, formas e práticas escolares, trazendo inúmeros e diversos desafios para professores, estudantes e gestores. Na tentativa de minimizar efeitos negativos de todo esse cenário, instituições de ensino públicas e privadas improvisaram, em pouquíssimo tempo, uma “nova maneira de ensinar”, utilizando intensamente Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e tecnologias digitais.

Porém, com o passar do ano e diante das experiências e dificuldades inéditas vividas, questionamentos foram surgindo: mas afinal, que ensino é esse que se está a realizar? O que realmente vem a ser ensino remoto e ensino híbrido? Quais são as vantagens e desvantagens deles? Será que estudantes estão mesmo aprendendo? Que resultados podem ser esperados dessa situação toda? E o futuro, como fica?

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM) colocou em pauta e discussão essas e outras tantas necessárias e fundamentais questões durante a realização de seu IV Fórum de Ensino e II Mostra de Projetos de Ensino, ocorridos nos dias 25, 26 e 27 de maio, transmitidos ao vivo pelo canal da instituição no YouTube, com o tema O ensino remoto e as perspectivas para o ensino híbrido.

A reitora da instituição, Deborah Santesso Bonnas, destacou a importância desses eventos diante do contexto desafiador vivenciado pelo mundo todo e, mais especificamente pelo Brasil, com a adoção do ensino remoto e da possibilidade próxima de transição para o ensino híbrido. Lembrou que se soma a essa situação, agravantes como cortes e bloqueios orçamentários significativos sofridos por Institutos e Universidades Federais, chances de mudanças na lei de criação dos Institutos Federais tramitando no Congresso Nacional, entre outros. Porém, destacou que tais momentos de encontro, além de projetarem a instituição para a comunidade, também demonstram e reforçam o compromisso do IFTM com uma educação pública, gratuita e de qualidade.

“Aqui estamos nós, discutindo e realmente precisando discutir caminhos para uma educação inovadora, compartilhando experiências e dificuldades. Por isso esses momentos são tão importantes, não só para o IFTM, mas para toda a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica e também para diversas outras instituições de ensino, sejam elas públicas ou privadas. Apesar de todo um cenário que nos assusta, ainda vejo esse nosso encontro como a realização de um grande sonho, que perpassa por uma construção coletiva”, relatou Deborah.

Por decisão dos Comitês Locais de Gerenciamento de Crise presentes nos campi do IFTM e do Comitê Central de Gerenciamento de Crise, a instituição mantém seu ensino no formato remoto emergencial, de forma a reduzir impactos da pandemia na vida escolar dos estudantes. Porém, o pró-reitor de Ensino do IFTM, Márcio José de Santana, expôs sobre uma possível transição para o ensino semi-presencial, com olhar híbrido. Assim, reforçou a importância da realização do Fórum como uma maneira de se começar a entender tal transição e de se refletir sobre experiências tidas até então.

“Apenas mais para frente será possível de fato entender a dimensão total desses impactos, mas acredito que, com o fim da pandemia, muitos ensinamentos e novas ações e modelos ficarão. Nós aprendemos nesse mais de 1 ano, a dialogar mais e a estarmos mais próximos; a ter mais empatia; a conhecer nossos alunos de forma mais completa, o que nos auxilia a fazer políticas que realmente os atendam; a própria inclusão digital e as diversas ferramentas digitais que tivemos que aprender a usar. Então a gente precisa tirar esse legado em meio a essa tragédia”, afirmou Santana.

Discutindo conceitos e superando desafios

Airton Araújo de Souza Júnior, professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN), e um dos palestrantes do IV Fórum de Ensino do IFTM, esclareceu sobre alguns conceitos e compartilhou um pouco de suas experiências no desenvolvimento do ensino remoto na referida instituição.

“Hoje, no Brasil, nós temos formalmente o ensino presencial, a Educação à Distância (EaD) e o ensino semi-presencial. Mesmo após 1 ano de pandemia, eu encontro muitos professores e gestores escolares fazendo confusões entre esses termos, e ainda entre os termos ensino remoto e ensino híbrido. ”, relatou Airton.

A EaD, segundo o professor, deve ser entendida como uma modalidade de ensino de educação formal baseada na autoaprendizagem e na padronização que, somente em 2005, após o Decreto nº 5622, teve como centralidade a mediação pelas TICs. Além disso, é basicamente assíncrona, tanto para professores quanto para estudantes, e tem raros momentos de interação entre docentes conteudistas e alunos. No caso da EaD ainda, todas as disciplinas são ofertadas de forma online. Já o ensino semi-presencial é uma modalidade na qual algumas disciplinas do curso são ofertadas presencialmente e outras, virtualmente.

O ensino remoto emergencial, implantado em diversas organizações de ensino em virtude da pandemia da Covid-19, é apontado por Airton como sendo basicamente síncrono, possibilitando então mais interação entre professores conteudistas e estudantes. Tende à personalização, mas veio apenas com o foco de ensinar e de cumprir carga horária.

Por sua vez, o ensino híbrido é um programa de educação formal, e não uma metodologia, no qual estudantes aprendem, pelo menos em parte, por meio do ensino online, e uma outra parte, em uma localidade física supervisionada, que, no caso do Brasil, é a sala de aula, mas em outros países, por exemplo, são Centros de Ensino em shoppings e/ou galerias. No ensino híbrido, conforme esclareceu Airton, todas as disciplinas são ofertadas ao mesmo tempo tanto de forma online quanto de forma presencial, centrando nos estudantes os processos de aprendizagem, tanto na autoaprendizagem, que ocorre nos momentos online, quanto na aprendizagem colaborativa, que acontece nos encontros presenciais.

“O ensino híbrido assim, está dando a oportunidade de um aluno ensinar o outro, de se conectarem e de promoverem uma aprendizagem significativa. A hibridização então é a interdependência entre esses dois momentos, o online e o presencial, sendo que o online não deve ser a simples reprodução da aula presencial”, completou o professor.

Uma vez entendida essa combinação de aprendizagens, o maior desafio para docentes e estudantes frente a todo esse contexto é a mudança de comportamento: para docentes, faz-se necessário sair de um papel de expositor para um papel de mediador, tutor; para estudantes, desenvolver um perfil ativo, deixando de serem meros expectadores de aula.

Centenário de Paulo Freire e suas contribuições para o ensino remoto e o ensino híbrido

Paulo Freire, patrono da educação brasileira que em 2021 está completando seu centenário de nascimento, “é para ser lembrado, discutido e estudado o ano todo, em especial diante do cenário que estamos vivendo, que provoca em nós a necessidade de se colocar em prática várias de suas ideias, valores e princípios, tendo em vista demandas complexas, que requerem posicionamentos criativos”, destacou o coordenador de Ensino do IFTM, Geraldo Gonçalves de Lima.

“Se Paulo Freire estivesse aqui entre nós, ele também trabalharia numa perspectiva de pensar esse momento que estamos vivenciando, como ele sempre fez durante todo o seu trabalho”. Com essa fala, a professora Kátia Morosov Alonso, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), reforçou a necessidade de se atualizar conceitos e concepções freireanas, que em muito podem contribuir para os novos cenários e rumos da educação brasileira.

Mesmo diante da pandemia, que forçou instituições e docentes a trabalhar mais intensamente com o uso de tecnologias, o sistema de ensino-aprendizagem do Brasil insiste em ter e (re)produzir uma pedagogia baseada na transmissão de conhecimento e muito pouco em sua produção. “Paulo Freire já dizia da ‘obsolescência da educação’, que tem o professor como depositário de saber. Logo, é fundamental se pensar em outra relação pedagógica, baseada na mediação, na interação, como já propôs Freire”, disse Kátia.

A professora também relatou sobre a confusão e o uso inadequado de termos como ensino híbrido, que, na atualidade, está sendo encarado como a junção do ensino presencial e do ensino à distância. O ensino híbrido trata na verdade daquilo que é o uso mais intenso das tecnologias nos processos educativos e não deve prescindir de um projeto educativo numa perspectiva libertadora, conforme já apontado por Paulo Freire.

“Se eu vou usar mais intensamente as tecnologias, não significa que eu não tenha que pensar o projeto educativo, pensar de que lugar social falamos e a quem interessa o processo educativo numa perspectiva libertadora. Ainda é fundamental que pensemos as novas formas de comunicação, especialmente nesse momento, de forma a se produzir conteúdos que sejam efetivamente emancipatórios”, explicou Alonso.

Para assistir a todas as atividades do IV Fórum de Ensino do IFTM acesse o canal da instituição no YouTube.

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