Superstições antigas e as principais benzeduras

(Por Arnaldo Silva) A geração que teve infância no século passado, guarda nas lembranças as superstições e benzeções comuns naqueles tempos. Nos rincões de nosso interior, o acesso a saneamento, eletricidade, saúde pública e educação era bastante difícil. As famílias se formavam e colocavam em prática os ensinamentos passados de geração em geração, em sua maioria, voltada para superstições. Eram religiosos, professavam a religião Católica em sua maioria. Buscavam praticar sua fé, mesmo na ausência da igreja, já que nas comunidades rurais, onde vivia a maioria da população naqueles tempos, a presença de padres era muito pouca. As comunidades se reuniam por conta própria, às vezes construíam pequenas capelas na comunidade e faziam a tradicional reza do terço, seja nas capelas ou nas casas dos moradores. Tudo com a maior simplicidade e boa fé possível. A vida isolada no sertão e o pouco conhecimento que tinham, geravam superstições, muitas delas vindas com os portugueses e africanos que para cá vieram. As vidas das pessoas naqueles tempos eram cercadas de crendices e superstições, desde o nascimento, até a fase adulta.

Quando a criança adoecia, a dificuldade de encontrar médico e hospitais era enorme, por isso a figura das benzedeiras era importante. Toda comunidade tinha, pelo menos uma. Eram muitas, mas muitas mesmo. Eram mulheres simples, de bom coração, boas intenções e muito respeitada por todos. Eram mulheres de fé, que simplesmente faziam sinal da cruz, usando alguma erva, rezavam as tradicionais orações católicas e faziam as benzeções, recitando versos e fazendo o sinal da cruz. Eram mulheres comuns, bondosas, caridosas, que nunca falavam que tinha poderes sobrenaturais, apenas acreditavam ter fé e que pela fé as maldições eram afastadas da casa e da vida das pessoas, bem como acreditavam que a fé curava. (na foto acima, de Tiago Geisler, Dona Maria Tereza, uma das mais queridas benzedeiras do Serro MG)
Você vai conhecer comigo, as principais superstições tanto com recém-nascidos, que eram muitas, como as benzeduras e superstições normais, que até hoje ainda existem.
Relembrará porque com o desenvolvimento social, a população passou a ter mais acesso a educação, saneamento básico, hospitais e postos de saúde, além de terem opções maiores de conhecimento, com a internet, as benzedeiras e superstições quase não existem mais. Esses fatores afastaram a procura pelas benzedeiras e reduziu em muitos as superstições antigas, embora exista muita gente supersticiosa e benzedeiros e benzedeiras por nosso interior. Por isso vamos relembrar.
Numa época que quase não existia médicos e nem hospitais para atender toda a população, principalmente a rural, os partos eram feitos em casa mesmo, por parteiras. Tudo que era retirado na hora do parto, como umbigo, eram entregues aos pais para que providenciassem o que fazer. Geralmente eram enterrados nos quintais das casas, baseado na crença religiosa de que do pó nascemos e ao pó voltaremos.
Quando o umbigo do bebê caia, tinha que ser enterrado rapidinho. Ai é que entra a superstição. Não podia de jeito nenhum ser guardado como lembrança porque quem o fizesse, nunca conseguiria viajar ou mudar de cidade e se viajasse ou mudasse, daria tudo errado e voltava. Nem podia ser jogado fora como um lixo qualquer, porque o umbigo poderia ser comido por um rato e se acontecesse isso, o bebê seria, quando adulto, um ladrão.
Alguns enterravam o umbigo junto a uma roseira, porque assim a criança nascia bonita, saudável e querida. Outros preferiam perto de um cocho, por acreditar que traria sorte na vida. Tinha quem enterrasse o umbigo num terreno de hospital, pois acreditavam que a criança seria médico. Quando o umbigo era enterrado numa porteira, a criança seria um fazendeiro. Junto à soleira da porta de entrada, a criança seria caseira. Se o umbigo fosse enterrado num local onde os pais gostavam, os filhos voltariam ao local depois de adultos. E nesse raciocínio, iam enterrando os umbigos, de acordo com seus motivos e objetivos para a criança.
Além dessas crenças, havia outras superstições em relação a recém-nascidos e crianças, como por exemplo: quem escolhia o nome do filho era o pai e não a mãe, para dar sorte; beijar os pés dos bebês também dava sorte na vida.
Se uma mulher estiver grávida e comer frutos grudados, teria gêmeos. Outra superstição interessante é sobre as marcas de nascença indesejada. Havia uma crença bem antiga de que saliva curava. Neste caso, a mãe teria que lamber bastante a marca de nascença indesejada, o tempo que for necessário, para que ela desaparecesse.
Essas são algumas superstições envolvendo recém-nascidos, boa parte esquecidas pelo tempo. Eu pelo menos fiquei sabendo desde criança o destino de meu umbigo. Ele foi enterrado atrás da igreja de meu bairro. O objetivo de minha mãe com isso era que eu crescesse religioso e me tornasse sacerdote. Quase fui, cheguei a me preparar para ser seminarista, mas por fim, optei por ser jornalista mesmo.
Superstições
Eram interessantes também naqueles tempos as superstições que a gente adquiria com os nossos pais e avós, muitas das vezes enraizadas até hoje em nós. Lembro que toda vez que um chinelo virasse, tinha que desvirá-lo imediatamente, caso contrário, ia encontrar a mãe morta atrás da porta. Por via das dúvidas, ninguém deixava o chinelo virado.
E quem nunca evitou passar debaixo de escadas hein? Dava um azar danado fazer isso. Gato preto e sexta-feira 13 era sinal de mau agouro. Se alguém falasse algo que soasse a maldição, eram três batidas na madeira.
E quando a orelha esquentava e ficava vermelha? Dava era uma pulga atrás da orelha para saber quem estava falando mal da gente. Tinha até quem acreditava que andar com um trevo de 4 folhas na carteira ou se encontrar um, dava sorte. Mas também, quem andasse de costas estava lascado, porque dava um azar danado mesmo. Mas o maior terror mesmo era quando se quebrava um espelho. Terror porque eram sete anos de azar na vida, acreditavam. Naqueles tempos nunca uma mulher comia na panela. Era certeza que no dia do casamento, era chuva mesmo. Não dava para arriscar. Naqueles tempos, ruas asfaltadas eram raridades. Imagina chover nesse dia?
Pior era beijar o retrato do namorado ou da namorada. Dava um azar danado e o namoro acabava rapidinho. Mas se moça não quisesse casar, era só pedir para alguém varrer seus pés. Era tiro e queda. A mulher encalhava mesmo.
O bom mesmo era quando a mão coçava. Era dinheiro chegando. E quando chovia hein? Se havia espelhos na casa, tinha que cobrir todos. Se não fizesse isso, era raio para todo o lado dentro de casa. Acreditavam que espelhos atraiam os raios.
E aquela visita chata hein? Ia embora rapidinho quando se colocava uma vassoura atrás da porta. E aquelas noites estreladas e lindas? Coitado daquele que apontasse para as estrelas. Ia ficar com o dedo todo enrugado. Quem quisesse ter fortuna, se proteger de espíritos e estar perto dos pais quando esses morressem, nunca devia cortar as unhas a noite.
Quem achava que estava sendo vítima de olho gordo e mau-olhado, era só usar pimenta nos bolsos e espalhar pela casa, que estaria tudo resolvido. Se tiver medo de cobras, nem pense em assobiar à noite. Você irá atraí-las para sua casa. Pelo menos era o que acreditavam.
Mas a superstição que mais me assustava era misturar manga com leite. Matava mesmo, pelo menos era a crença. Tinha tanto medo que evitava chupar manga. Nunca vi alguém morrer por isso, mas falavam tanto dessa mistura que nem manga eu chupava. Por precaução mesmo.
Benzeduras
Tem tantas superstições que nem me lembro de todas, mas o interessante mesmo eram as benzeções. Dificilmente irá achar hoje quem nunca tenha sido benzido no século passado. Eu fui, não me lembro de quê, mas fui. Benzer significa tornar bento, abençoar uma pessoa através da oração e rezas tradicionais Católicas, para que delas se afastem os males espirituais e doenças.
As benzedeiras se aproximavam com suas ervas e Rosário nas mãos, faziam o sinal da cruz e rezavam, por fim, recitavam versos de acordo com a benzeção. Vou citar apenas algumas das principais benzeções:
Para quem sofria de quebrando a reza era essa:
Deus te remiu
Deus te criou
Deus te livre
De quem para ti mal olhou.
Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo,
Virgem do Pranto,
Tirai este quebranto.

Dizer a oração 3 vezes.
Já para o mau-olhado as benzedeiras pegavam um copo com água e colocavam algumas gotas de azeite na água e dois pauzinhos em forma de cruz. Se o azeite espalhasse, era mesmo mau-olhado e com o Rosário nas mãos, rezavam:
Jesus que é o Santo nome de Jesus, onde está o santo nome de Jesus não entra mal nenhum.
Eu te benzo criatura do olhado se for na cabeça a Senhora da cabeça e se for na cara a Senhora de Santa Clara e se for nos braços o Senhor de S. Marcos e se for nas costas as Senhoras das Verônicas e se for no corpo o meu senhor Jesus Cristo que tem o poder todo.
 Santa Ana pariu a Virgem, meu Senhor Jesus e assim com isto é verdade assim este olhado daqui tirado para as ondas do mar, seja lançado para onde não ouça galos nem galinhas cantar, em louvor de Deus e da Virgem Maria, padre nosso e avém Maria.
Em seguida, a benzedeira rezava uma Salve Rainha nove vezes.

Para dores na cabeça, começavam fazendo o sinal da cruz e dizia:
Pelo sinal da Santa Cruz, livre-nos Deus Nosso Senhor dos nossos inimigos, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, amém. ( nome da pessoa), eu te benzo da dor de cabeça que tens ou dos maus olhos que para ti olharam, ou vento ou sol, ou o mau tempo que por ti passou. Diz-se três ou cinco vezes.

Para quem estivesse com o nervo torcido a benzedeira recitava:
Jesus que é o Santo nome de Jesus, onde está o Santo nome de Jesus não entra mal nenhum.
A pessoa que vai coser pega numa agulha e num novelo de linha e diz:
Eu coso. E quem está padecendo responde:
Carne quebrada nervo torto.
Cosa a Virgem melhor do que eu coso, a virgem cose pelo são e eu coso pelo vão. Em louvor de Deus e da Virgem Maria, Padre Nosso e Avém Maria
Depois de se fazer esta benzedura, molha-se os dedos no azeite e esfrega-se a parte dorida. Reza-se um Pai Nosso e uma Ave Maria, a Santo Amaro, advogado de pernas e braços e oferece-se ao Nosso Senhor Jesus Cristo. Repetia-se por 9 vezes.

Espinhela caída, aquela dor no estômago, costas e pernas e muito comum naqueles tempos. A benzedeira recitava por 9 vezes essa oração:
Jesus que é o Santo nome de Jesus, onde está o Santo nome de Jesus não entra mal nenhum.
Quando a Nossa Senhora pelo mundo andava, chegou à casa de um homem manso e de uma mulher brava, pedindo-lhes pousada.
O homem dava e a mulher não.
Onde Nossa Senhora se foi deitar, água por baixo e água por cima; com estas mesmas palavras, cura a dor de barriga, em louvor de Deus e da Virgem Maria.

Por fim, rezava um Pai Nosso e uma Ave Maria.

Para curar dor de cabeça e de ouvidos, a benzedeira fazia o sinal da cruz, colocava as mãos com o terço na cabeça da pessoa e rezava assim:
Jesus que é o Santo nome de Jesus, onde está o Santo nome de Jesus não entra mal nenhum. (nome da pessoa a benzer), eu te benzo do mal e de ar maldito, quem te trouxe, e de ar frio e de ar quente. (Pega-se numa faca) Com esta faca te lançarei, pernadas do ar cortarei e daqui para fora te deitarei e com o poder de Deus e da Virgem Maria, um Pai nosso e uma Avém Maria.
Repete-se nove vezes a Benzedura e benze-se novamente a pessoa, com as mãos e o Rosário sobre a cabeça da pessoa a ser benzida, recitando: Nossa Senhora que leve o mal que a pessoa tem para o outro lado do mar, onde não ouça galo nem galinha cantar e nem mãe por filho chamar e Nossa Senhora dê as melhoras. Amém.

Para se livrar da tentação do mal, as benzedeiras rezavam essa reza as terças e sexta-feiras, até que a tentação se afastasse: 

Em louvor do Santíssimo Sacramento do Altar, a minha casa vou benzer e defumar, e que todos os males existentes na mesma, que vão para casa de quem nos desejar (repetia-se a última expressão três vezes). Enquanto se faz a repetição, bate-se com o pé esquerdo três vezes. No final reza-se um Pai-Nosso.

Tem mais rezas, benzeções e superstições, mas que eu me lembre, essas são as principais.

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